Moscas

O que é aquele zumbido irritante? O que é aquilo rastejando pela tela do televisor? Garçom, o que é isso flutuando na sopa? A menos que a pessoa viva nas regiões polares, a resposta a todas essas perguntas, mais cedo ou mais tarde, é inevitavelmente a mesma: a mosca doméstica comum.

Embora existam certamente outros insetos que se acomodam confortavelmente em nossas casas, 90% das moscas encontradas em nossas moradias são membros da espécie específica musca domestica. O termo “mosca doméstica” não é genérico; trata-se de um tipo específico de mosca que  parece ter encontrado seu nicho evolutivo vivendo entre nós.

Mas o problema com as moscas não é apenas que nos irritam com suas invasões. Elas portam e difundem diversas doenças potencialmente mortíferas, entre as quais a febre tifóide, salmonella, tuberculose, conjuntivite, lepra e cólera, bem como vermes intestinais  e a bactéria responsável pela disenteria. Elas se alimentam e reproduzem com lixo, fezes e carne apodrecida. E então, depois de recolher milhões de microorganismos, voam para dentro de nossas casas e pousam em nossa comida, corpos e objetos pessoais, deixando para trás os mesmos germes.

Neste artigo, observaremos mais de perto a mosca, sua a anatomia e o ciclo de vida que ela propele, e quais são as melhores formas de proteção.

A cabeça da mosca

Ainda quem as moscas sejam as rainhas dos insetos que vivem de detritos, há muitos predadores à espera da chance de devorá-las. Aranhas, rãs, lagartos, mariposas, vespas  e até mesmo membros do reino vegetal, gostariam de uma fatia de torta de mosca. Além disso, os seres humanos costumam impedir que as moscas entrem em suas casas, ou simplesmente as “exterminam” quando as encotram. Para ajudá-las a superar todos esses obstáculos, as moscas contam com excelente capacidade sensorial e manobrabilidade aérea notável.

Como em todos os insetos, o corpo da mosca fica coberto por um exoesqueleto rígido feito de quitina, e se divide em três partes: cabeça, tórax e abdômen.

Um par de olhos complexos cobre a maior parte da cabeça da mosca. Cada olho abriga entre três e seis mil olhos simples. Ao contrário dos olhos dos vertebrados, os das moscas não podem focalizar detalhes do ambiente que as cerca. Em lugar disso, oferecem uma excelente visão em mosaico de tudo, à esquerda, direita, acima e abaixo da mosca. Imagine o segurança de um cassino, constantemente vasculhando um banco de monitores de vídeo para descobrir quem pode estar trapaceando, bebendo e causando algazarra ou agindo de maneira suspeita. O guarda contempla as áreas em busca de potenciais ameaças. O mesmo se aplica aos olhos das moscas, em larga medida, mas elas dispõem de milhares de monitores que permitem que detectem até mesmo o menor movimento, de todas as direções.

As moscas também dispõem de outros três olhos simples chamados ocelli, localizados entre os dois olhos compostos. Imagine o ocelli como uma espécie de dispositivo de navegação ou bússola, que permite que a mosca saiba  que lado fica para cima. A mosca realiza essa tarefa observando e se movimentando na direção de áreas iluminadas pelo sol. É por isso que é tão frequente ver moscas zumbindo diante das janelas.

Cabeça da mosca
As moscas dependem de seu apurado olfato, fornecido por suas antenas. Para saborear e consumir refeições, o inseto utiliza o probóscide, um apêndice com jeito de desentupidor de pia que se estende do fundo da cabeça. Dois pequenos órgãos sensórios semelhantes a antenas, chamados papilas maxilares, permitem que a mosca prove sua comida. A porção final do probóscide é conhecida como labellum, e termina em uma boca esponjosa com a qual a mosca suga a comida.

Mas como a mosca obtém sua comida? A seguir, examinaremos suas impressionantes asas e pernas.

Pernas e abdômen

O tórax da mosca abriga todos os órgãos usados em seu movimento. Ainda que as moscas pareçam dispor de apenas um par de asas, uma inspeção mais atenta revela a presença de pequenas asas secundárias, conhecidas como cabrestos, localizadas abaixo do par principal.

Embora seus ancestrais mais distantes voassem com dois conjuntos completos de asas, as moscas aprenderam a se virar com menos. Ao longo de milhões de anos, o par inferior evoluiu para os apêndices encolhidos que hoje encontramos. Mas elas não são inúteis. Longe disso. As moscas usam as asas menores e as batem em alta velocidade quando em voo, para manter o equilíbrio no ar. Caso uma das asas menores seja removida, a mosca só pode voar em círculos. Sem as duas, ela não voa.

As asas primárias fazem o resto do trabalho, batendo 200 a 300 vezes por segundo, em velocidade média de 7,2 km/h. As asas oferecem força suficiente e precisão para decolagem imediata e manobras aéreas complexas, como espirais apertadas, ziguezagues e até manobras em ré.

E há também as pernas, que a mosca usa para provar tudo em que pousa. Os minúsculos pêlos no segmento final da pata, ou tarso, funcionam como as papilas gustativas humanas. Por isso, muitas vezes vemos moscas caminhando em círculos em torno de potenciais refeições.

Anatomia da mosca

É normal observarmos a mesma mosca andando no chão e no teto. A sola dos pés das moscas ostenta garras minúsculas e almofadas úmidas de sucção chamadas pulvilli, que permitem a uma mosca pousar em qualquer lugar.

O abdômen contém outros órgãos essenciais, como o  ovipositor, que coloca os ovos (nas fêmeas) e o aedeagus, que deposita o esperma (nos machos). Ambos ficam retraídos quando não estão em uso.

Assim, as moscas parecem dispor de todo o equipamento necessário para obter uma refeição, mas como fazem para comê-la?

A dieta das moscas

Assim que uma mosca fareja algo de interessante e prova a comida com os pés e papilas, chega a hora de engolir o delicioso bocado.

Caso a refeição em questão já seja líquida,a  tarefa é fácil. Já que os componentes da boca de uma mosca são projetados para sugar e ingerir alimentos liquefeitos, bastando para tal acionar a sucção. O alimento vai diretamente para o estômago da mosca.

Comidas sólidas são ligeiramente mais difíceis. Moscas não podem morder ou mastigar, pois falta-lhes o equipamento requerido. Assim, se forçadas a enfrentar algo mais sólido, como um grão de açúcar ou sangue seco, elas têm de empregar tática diferente.

Primeiro, a mosca raspa a comida seca com os pelos do extremo do probóscide. Isso libera as partículas alimentares que estiverem soltas e esfareladas.

O segundo passo pode ser comparado ao que acontece quando acrescemos água a um mingau instantâneo, mas no lugar de água, as moscas adicionam uma mistura de saliva e sucos digestivos. A mosca vomita saliva e material digestivo sobre a comida e, alguns segundos depois, os sucos dissolvem a comida e a mosca suga tudo de volta.

Embora isso possa nos parecer bizarro, lembrem-se de que a mosca não está adicionando à sua comida nada que não adicionemos à nossa. A diferença é que nossos dentes e mandíbulas permitem que dividamos matéria orgânica em porções suficientemente pequenas para que possamos misturá-las com os sucos digestivos em nossos estômagos. A mosca está fazendo a mesma coisa, mas do lado de fora do corpo.

Caso o vômito não seja capaz de dividir a comida o suficiente para que ela passe pelo tubo que conduz ao estômago, a mosca a envia, por outro tubo, para uma bolsa interna chamada bucho. A mosca pode fazer a bolha de alimento em dissolução passar diversas vezes pelo canal entre bucho e boca, aplicando saliva fresca em cada percurso. Por fim, a refeição liquefeita estará pronta para ser enviada ao estômago.

Se todo esse vômito não lhe parece higiênico, bem, é porque realmente não é. Não só existem germes potencialmente mortíferos nas pernas com que uma mosca pode caminhar sobre (e provar) seu sanduíche como, se ela decidir se alimentar, pode regurgitar sobre ele porções de sua refeição anterior. Isso só multiplica o risco de doença, e é por isso que devemos manter as moscas longe da comida.  Todos esses vôos e alimentação têm um propósito – o mesmo que encontramos em qualquer outro animal. Esses insetos querem se reproduzir e enviar ao mundo uma nova geração.

O ciclo de vida da mosca

O ciclo de vida da mosca espelha o da maioria dos insetos: um ciclo básico que começa com um ovo que depois se desenvolve por uma fase larva, uma fase pupa e por fim no animal adulto. Em um verão quente – condição ideal para as moscas -, o ciclo de ovo fertilizado a adulto requer apenas de sete a 10 dias.

Depois que a mosca macho persegue e fertiliza a fêmea, esta está pronta para pôr ovos. As moscas são criaturas solitárias. Como no resto do mundo dos insetos, machos e fêmeas não permanecem juntos depois do acasalamento e, ao contrário dos insetos que preparam ninhos, as fêmeas não cuidam dos ovos ou os protegem. Elas simplesmente os deixam em lugar seguro contra predadores e dotado de alimentação suficiente.

O ciclo de vida da mosca

A mosca fêmea deposita seus ovos em fendas e cantos de alguma espécie de matéria orgânica em decomposição da qual os insetos adultos se alimentam. Em um dia, as primeiras larvas começam a emergir dos ovos. Conhecidas também como vermes, as larvas são pouco mais que tubos carnudos sem divisões, com bocas em forma de ganchos usadas para alimentação.

Os vermes crescem rapidamente. Em menos de dois dias, dobram de tamanho e devem, portanto, passar pela muda. A muda é um processo comum a diversos invertebrados, por meio do qual os insetos em desenvolvimento abandonam seu exoesqueleto anterior e desenvolvem um novo. Um verme passará por mais duas mudas, emergindo maior e mais desenvolvido de cada uma.Depois da terceira muda, as larvas se enterram profundamente na substância de que vêm se alimentando. Suas peles se escurecem e endurecem e elas passam ao estágio de pupa. Dentro dessa casca protetora, a larva desenvolverá plenamente os segmentos de corpo e apêndices de uma mosca adulta.

A única adição visível à mosca adulta é um calombo inchado na cabeça, usado para romper a casca. Por ela não dispor de dentes ou mandíbulas para mastigar, usa seu bucho repleto de fluido para romper a casca da pupa. Ao emergir plenamente, o calombo desincha.

Uma nova mosca adulta tem no máximo três meses para se reproduzir antes de morrer. Com tantos predadores, a vida média de uma mosca é ainda menor: 21 dias. Por sorte das moscas, a expressão “procriando como moscas” não é figura de linguagem: cada fêmea pode colocar até 900 ovos durante sua breve vida.

A ideia de uma infestação por moscas pode se provar perturbadora demais para muitos proprietários de casas.

Moscas úteis

As moscas portadoras de germes vêm às nossas casas sem ser convidadas, e começam a caminhar, se alimentar, vomitar e depositar ovos em nossos objetos pessoais. Trazem com elas o risco de doença e, em troca, fazemos o que podemos para exterminar esses visitantes indesejados. Mas será que elas são assim tão más?

Embora não haja muita coisa boa em sua presença nas casas, as moscas desempenham um papel importante ao se alimentar de restos. à medida que as moscas e suas larvas se alimentam, consomem nutrientes em matéria orgânica apodrecida. Deixam para trás restos consumidos que outros organismos, bactérias e enzimas, podem dissolver ainda mais.

Moscas e suas larvas também são importante fonte de alimentação para grande número de predadores. As pupas das moscas contêm grande volume deproteína e assim são especialmente benéficas para os diversos pássaros, répteis e insetos que as tomam como presas. Afinal, existe um motivo para que vermes sejam muitas vezes usados como iscas de pesca. Os criadores comerciais de tilápias já consideraram alimentar seus peixes apenas com vermes de moscas. Pode-se até mesmo adquirir pupas congeladas de moscas para alimentar aranhas de estimação.

Administrando as moscas

Travar guerra contra as moscas pode ser simples: basta manter uma cozinha limpa ou ainda introduzir novos predadores e tecnologias apropriadas em sua casa. Avalie as seguintes opções:

• Saneamento: a arma essencial em qualquer guerra contra as moscas é a limpeza. Ao manter a casa limpa, os lugares em que elas podem se alimentar e procriar ficam limitados. Não deixe alimentos descobertos e expostos, e mantenha todo o lixo em recipientes fechados. Da mesma forma, mantenha a área em torno de sua casa livre de lixo a descoberto, esterco e matéria orgânica em decomposição.

• Controle biológico: não faltam inimigos às moscas, porém, naturalmente, você não deseja encorajar mais comedores de moscas do que o necessário em sua casa. A única exceção é a dionéia, que, se bem cuidada, pode reduzir a população de moscas em uma residência. Do lado de fora, as opções dependem muito de onde você viva, mas talvez seja melhor não remover as teias de aranha e ninhos de vespa em seu terreno, se as moscas o preocupam. Algumas empresas vendem uma espécie de vespa parasitária chamada pteromalidae a agricultores. As larvas da vespa se alimentam de pupas de mosca e não afetam o restante da fazenda.
• Exclusão: um dos métodos essenciais para reduzir o problema da moscas é simplesmente impedir a entrada de moscas adultas em sua casa. Mantenha portas, janelas e respiradouros fechados e use telas para permitir a entrada de ar fresco. Edifícios de alto movimento podem usar cortinas de ar em conjunto com portas automáticas, para manter as moscas de fora. Quando as portas se abrem, uma corrente forte de ar impede que as moscas voem para dentro.
• Controle físico: o exemplo mais simples disso seria matar os insetos com um mata-mosca – ainda que esse método em geral seja pouco sanitário porque causa manchas e deixa resíduos. Papel pega-mosca e  armadilhas para moscas são outros recursos. O papel pega-mosca oferece aos insetos um aparente banquete, e quando elas pousam nele suas pernas ficam presas a uma cola pegajosa. As armadilhas para moscas atraem os insetos com alimentos aparentemente saborosos; depois que entram, elas não conseguem mais sair e terminam caindo na água e se afogando. Algumas armadilhas usam a luz ultravioleta para atrair as moscas. A mosca aprisionada depois é eletrocutada por uma grade eletrificada, sugada para uma câmera de desidratação ou capturada com cola.
• Controle químico: em termos gerais, o uso de pesticidas deveria ser moderado, especialmente dentro de casa. Mas antes de começar a usar produtos químicos venenosos contra as moscas, tenha certeza de que tentou enfrentar o problema por meio de saneamento, exclusão e controle físico. Diversos pesticidas para uso doméstico contra moscas estão disponíveis, mas respeite rigorosamente as instruções, tendo em mente a saúde dos membros da família e dos animais. Produtos  como tiras de pesticida afixadas a paredes só devem ser usadas em áreas não ocupadas, como sótãos.